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O Fim do Aluguel Informal: Como o "CPF dos Imóveis" e a Nova Fiscalização da Receita Vão Transformar o Mercado de Locação

  • Foto do escritor: Paulo Polli
    Paulo Polli
  • 3 de nov.
  • 4 min de leitura
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Uma revolução silenciosa está em curso no mercado imobiliário brasileiro, e ela tem um alvo claro: os "contratos de gaveta" e a sonegação de rendimentos de aluguel. A Receita Federal do Brasil (RFB) está implementando uma nova e poderosa arquitetura de fiscalização que promete encerrar décadas de informalidade, tornando a omissão de receitas uma aposta de altíssimo risco. A partir de agora, a pergunta não é se um contrato informal será descoberto, mas quando.


Por anos, a fiscalização de aluguéis dependeu de auditorias pontuais e do cruzamento manual de informações, um modelo que deixava brechas para que locadores e locatários fizessem "acordos de cavalheiros" para não declarar a operação, fugindo do Imposto de Renda. Esse cenário mudou drasticamente. Com a implementação do Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB), apelidado de "CPF dos imóveis", e do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter), a Receita Federal passa a contar com um arsenal tecnológico capaz de cruzar dados em tempo real e identificar inconsistências de forma automática.


A base legal para essa transformação vem da Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a Reforma Tributária, e da Instrução Normativa RFB nº 2.275/2025, que detalha as novas obrigações. Juntas, essas normas criam um ecossistema de controle onde a sonegação deixa um rastro digital impossível de ser ignorado.


A Nova Arquitetura de Controle: Como Funciona o Cerco Digital


A nova estratégia da Receita se baseia em dois pilares tecnológicos interligados:


  1. O "CPF" dos Imóveis (CIB): O Cadastro Imobiliário Brasileiro atribui um código único a cada imóvel do país, seja ele urbano ou rural. Esse identificador padronizado acaba com a fragmentação de registros entre prefeituras, cartórios e outros órgãos, que historicamente dificultava o rastreamento de propriedades. O CIB será obrigatório em todas as transações e documentos oficiais, de escrituras a contratos de locação.


  2. O Cérebro Central (Sinter): O Sinter é a plataforma que integra e processa as informações vinculadas ao CIB. Ele será alimentado continuamente por uma vasta gama de fontes: cartórios, prefeituras, declarações de Imposto de Renda e outros cadastros governamentais. Seu algoritmo foi projetado para uma tarefa específica: encontrar divergências.


O cruzamento de dados é a peça-chave. O sistema irá, por exemplo, comparar o CPF do proprietário registrado no CIB com o CPF do morador declarado em outras bases (como no próprio IRPF ou em contas de consumo). Se o morador não for o dono, o sistema automaticamente buscará na declaração do proprietário o correspondente rendimento de aluguel. A ausência dessa informação dispara um alerta imediato para a fiscalização.

Essa automação inverte o ônus da prova. Antes, a Receita precisava provar a sonegação. Agora, o sistema identifica a anomalia, e caberá ao proprietário justificar por que outra pessoa ocupa seu imóvel sem gerar renda, por exemplo, através de um contrato de comodato (empréstimo gratuito) devidamente formalizado.


As Obrigações e as Pesadas Penalidades


A nova fiscalização não cria um novo imposto, mas garante o cumprimento da legislação já existente. Todo locador pessoa física que recebe aluguel de outra pessoa física acima do limite de isenção é obrigado a recolher o imposto mensalmente via Carnê-Leão e, posteriormente, consolidar as informações na Declaração de IRPF anual.

O inquilino, por sua vez, embora não possa deduzir o aluguel residencial, tem a obrigação de informar os pagamentos na ficha "Pagamentos Efetuados", detalhando o CPF do locador. Essa declaração do locatário se torna uma das principais ferramentas de cruzamento de dados do Fisco.


O descumprimento dessas obrigações, agora facilmente detectável, acarreta sanções severas:


  • Para o Locador: A omissão de rendimentos de aluguel, quando identificada pela fiscalização, resulta em uma multa de ofício de 75% sobre o valor do imposto devido. Se for comprovada fraude ou dolo, a multa sobe para 150%.

  • Para o Locatário: O inquilino que não declarar os pagamentos de aluguel está sujeito a uma multa de 20% sobre os valores não informados.

  • Juros e Risco Criminal: Sobre todo o imposto não pago incidem juros baseados na taxa Selic. Dependendo do caso, a sonegação fiscal pode ser enquadrada como crime contra a ordem tributária, levando a processos na esfera criminal.

Tabela de Penalidades para Locadores e Locatários


Infração

Penalidade Aplicável

PARA O LOCADOR (PROPRIETÁRIO)


Não pagamento ou atraso do Carnê-Leão

Multa de 0,33% ao dia (limitada a 20%) + Juros (Taxa Selic)

Omissão de rendimentos (identificada pela fiscalização)

Multa de ofício de 75% sobre o imposto devido + Juros (Taxa Selic)

Omissão com comprovada fraude ou dolo

Multa qualificada de 150% sobre o imposto devido + Juros (Taxa Selic)

PARA O LOCATÁRIO (INQUILINO)


Não declarar o aluguel pago no IRPF

Multa de 20% sobre o valor total dos aluguéis não declarados


O Futuro da Tributação com a Reforma Tributária


A criação do CIB e do Sinter também prepara o terreno para as mudanças da Reforma Tributária. A partir de 2027, locadores com atividade imobiliária de maior escala poderão ser tributados pelo novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), além do IRPF.


O novo regime se aplicará a pessoas físicas que alugam mais de três imóveis ou que possuem uma receita anual de aluguéis superior a R$ 240.000,00. Para proteger a população de baixa renda, a reforma prevê isenção total de IBS e CBS para aluguéis residenciais de até R$ 600,00 mensais.


Recomendações: Como se Adaptar à Nova Realidade


Diante de um cenário de fiscalização total, a conformidade fiscal deixa de ser uma opção e se torna uma necessidade estratégica.


Para Locadores:


  • Regularize-se Imediatamente: Se você possui rendimentos não declarados, procure regularizar sua situação o quanto antes para evitar as pesadas multas de ofício. Isso envolve preencher o Carnê-Leão retroativo dos últimos cinco anos e retificar as declarações de IRPF.

  • Formalize Tudo: Contratos de locação e, principalmente, de comodato (empréstimo gratuito) devem ser feitos por escrito e registrados para servirem como prova perante o Fisco. Guarde todos os comprovantes de despesas dedutíveis (IPTU, condomínio, etc.).


Para Locatários:


  • Declare Sempre: Cumpra sua obrigação de informar os aluguéis pagos na sua declaração de IRPF para evitar a multa de 20%.

  • Exija Recibos: Peça sempre recibos formais dos pagamentos de aluguel. Eles são sua principal prova de quitação.


A era da informalidade no mercado de aluguéis chegou ao fim. A nova realidade exige transparência e rigor, e adaptar-se a ela é o único caminho para evitar problemas com o Leão.



Paulo Polli

Duas décadas de mercado imobiliário

CRECI PR 19555

CRECI SC 41607

PERITO AVALIADOR 45083

 
 
 

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